Izaias Resplandes
O poeta é um filósofo: vê o que poucos vêem e analisa e discute o que todos não conseguem ver.
A Filosofia Geral é uma das disciplinas obrigatórias na maioria dos cursos superiores, dentre os quais o de Direito. Embora alguns não gostem, ela é uma matéria essencial para a formação dos seus futuros operadores. Por meio dela, se aprende a questionar o mundo que nos parece estar estabelecido à nossa volta e a desafiar a nossa capacidade de se impressionar diante dos acontecimentos do quotidiano, às vezes tão simples mas, às vezes tão brutais.
A sociedade como um todo, acostumou-se a viver neste mundo e a aceitá-lo como normal, de tal sorte que ninguém estranha com nada e, algumas vezes, nem percebe que coisas fantásticas estão acontecendo diante dos seus olhos. Por exemplo, quem ainda não teve aquele ‘insight”, “heureca”, “achei” ou “ah-rá!” diante de uma situação antiga ou corriqueira e que de repetente pareceu tão inusitada? Quase todos já passamos por isso. Muitos já devem ter perguntado a alguém: “onde você estava que eu nunca te vi?”
A poesia, tal qual a Filosofia, nos faz ver o mundo com outros olhos. Lendo e discutindo recentemente “O mundo de Sofia”, na UNICEN, em Primavera do Leste, fizemos uma fantástica aventura, começando pela criação, passando pelos dias atuais e fazendo conjecturas sobre o amanhã da humanidade. Quantas vezes debatemos no “Boulevar Érico Piana”, se nós estamos vivendo no mundo real ou se estamos sonhando e, a qualquer hora, acordaremos e veremos que a realidade é bem diferente? Jostein Gaarder semeia a dúvida em nossa cabeça, porque é bem verdade que quando sonhamos, nem sempre temos consciência de que as imagens do sonho são parte de um sonho; nós costumamos pensar que é tudo verdade e que tudo aquilo está acontecendo mesmo. É praticamente tudo da mesma maneira que acontece agora, quando nós também pensamos que tudo o que está acontecendo é verdade. Mas nós podemos ter certeza de que nossa vida é real e não um sonho? Alguns pensam que podem. Outros não. O René Descartes concluiu que sua vida não era um sonho. Disse ele: cogito, ergo sum (penso, logo existo).
Entrando no mundo das elocubrações, dizia certa feita aos meus colegas do Direito, que alimento e sustento em meu estômago uma grande quantidade de “vermes”, lombrigas e coisas semelhantes e que elas dependem de mim para continuar a viver. Eu sou um deus para elas, embora elas não saberiam dizer quem ou o que eu sou, mesmo que fossem inteligentes. Saberiam apenas que em algum lugar daquele “bucho” universal onde elas vivem ou mesmo em todo ele, existiria alguém ou alguma coisa que garantia a sua existência. Mas saindo do bucho em questão, o que se vê é que o tal “deus” não passa de um mortal comedor de feijão, que um dia, em um fatalismo inevitável, vai para o beleléu com todas as suas lombrigas. Quem garante que não estamos no ventre de alguém? Como podemos ter certeza de que nosso mundo não é semelhante ao mundo de nossas lombrigas? Essa é uma pergunta que a nossa racionalidade não pode explicar. Então recorremos à fé e simplesmente acreditamos dogmaticamente, sem discussão, que somos criaturas de Deus e que nele nos movemos e nele existimos.
Está errado o nosso procedimento? De forma alguma! Como diz o Mestre Prof. José Carlos Iglesias, “nós não podemos abandonar as nossas crenças, se não temos algo melhor para colocar em seu lugar”. Muitos estão perdidos porque não se apegam em nada. E o nada, só pode levar alguém a lugar algum. Temos que nos definir por alguma coisa e justificá-la de alguma forma. O que não podemos é simplesmente “ficar” no mundo, de forma neutra, como se nada tivéssemos com tudo o que acontece ao nosso redor. Ninguém precisa ficar sem resposta. A poesia é composta de muitas possibilidades. Para ela tudo é possível e ninguém discute o que o poeta diz. Ela é uma forma louca para se questionar a realidade, ser considerado normal e ainda ser aplaudido.
Por isso precisamos da poesia e dos poetas. Nós temos que questionar a realidade. A busca da verdade real é o alvo de todos nós. Não podemos ser iludidos por uma indiferença. Da nossa atitude dependerá a vida e a morte dos nossos semelhantes. Como dizia o Aristóteles, embora também seja importante, não dá para simplesmente ficarmos perguntando “de onde viemos”, “como viemos” e “para onde vamos”, mas também é necessário saber o “para que viemos” e qual é a finalidade de nossa existência.
Nós estamos fazendo uma viagem fantástica pelo espaço sideral, em muitas dimensões simultâneas. Diariamente, damos uma volta ao mundo, percorrendo em torno de 40 mil quilômetros, em uma velocidade aproximada de 1670 km/h. Anualmente, fazemos a viagem orbital em torno do sol, em uma velocidade de 28,9 km/s, quase 104 mil km/h. E o fantástico não para por aí. A Terra juntamente com todos os astros que compõem o sistema solar, faz o movimento de translação em direção ao ápex, que fica entre as constelações de Hércules e de Libra, em uma velocidade aproximada de 20 km/s.
Como podemos ficar indiferente a tudo isso? Como podemos viver em busca de anjos e de marcianos, se não somos capazes de ver e de entender porque estamos viajando pelo espaço, em uma espaçonave gigantesca de 1 trilhão de quilômetros cúbicos de volume, na companhia de seis bilhões de passageiros?
A conclusão a que chegamos é que não dá para viver sem a filosofia, a não ser que sejamos simples lombrigas anencefálicas, da mesma forma que não dá para viver sem a poesia, a não ser que estejamos mortos.
Viva a poesia! Salve os poetas e sua filosofia!
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