Izaias Resplandes[i]
Estamos vivendo o tempo da alternância no poder político em nosso país, o que requer de cada um de nós, um conhecimento mais aprofundado das regras que norteiam o processo de transição governamental.
Mudar, ou não mudar, eis a questão – diria Shakespeare. O certo é que, seja Lula, seja Alckmin, não se pode continuar/mudar sem que se saiba o que deve continuar ou o que deve mudar. A esse respeito é oportuna a lição do nacionalista Monteiro Lobato, através de seu personagem Américo Pisca-Pisca, o qual resolvera tomar para si o encargo de reformador do mundo (LOBATO, Monteiro. O reformador do mundo. Fábulas. 16.ed., São Paulo: Brasiliense, 1973).
Américo não se conformava com o fato de existirem na natureza muitos dos elementos que ele considerava inúteis, como por exemplo, os sapos e as chuvas. Mas o cúmulo de sua indignação era o fato das jabuticabas (tão pequenas) estarem naquelas imensas jabuticabeiras, enquanto que as grandes abóboras eram frutos das frágeis aboboreiras. Para ele isso teria que ser mudado. Nesse vai-e-vem reflexivo, adormeceu embaixo da frondosa e produtiva jabuticabeira. E então sonhou com o novo mundo totalmente reformado por ele. Era uma terra muito quente, haja vista não haver chuvas para alimentar o ciclo das águas. Também era cheio de mosquitos e maribondos de todos os tamanhos e tipos, dada a inexistência de sapos para comê-los. E assim sonhava Pisca-Pisca, quando “pluft!”, é bruscamente acordado por uma jabuticaba lhe caíra sobre o nariz. Então concluiu seu projeto de reforma achando que seria oportuno tudo ficar do jeito que estava. “Espiga! Se fosse uma abóbora, então ele teria sido a primeira vítima de seu mundo reformado”, concluiu.
O que nós desejamos que continue ou que mude em nosso país? Qual dos candidatos traz as propostas que nós desejamos realizadas pelo próximo presidente? Isso é algo de importância capital e que se precisa estar claro para cada eleitor desse Brasil dividido entre o tucano Geraldo Alckmin e o petista Lula da Silva. E esse é realmente o xis da questão eleitoral deste ano.
Segundo analistas políticos, os programas de governo dos dois candidatos se confundem pelas semelhanças entre eles. Para o jornalista Luís Brasilino, “fica difícil identificar para quem os presidenciáveis pretendem governar: se para os latifundiários ou para os sem-terra e pequenos agricultores, se para as transnacionais ou para os operários, se para os bancos ou para as indústrias, se para a exploração ou para a preservação ambiental, se para os Estados Unidos ou para Cuba etc.”.
Ambos prometem reduzir os juros para combater a dívida (atualmente eles consomem 17% do PIB brasileiro); os dois prometem continuar com o Programa Bolsa Família, reduzir impostos, aumentar o crédito; ambos não estabelecem metas para reforma agrária, mas dizem que não basta dar terra e que é preciso dar crédito e serviços sociais; o ProUni (Programa Universidade para Todos) também será mantido pelos dois candidatos. Em suma, não existem diferenças significativas entre os programas de governo dos dois candidatos. Eles propõem a mesma coisa com palavras diferentes.
Nessa verdadeira confusão de programas de governo, onde não se sabe o que é de Lula ou o que é de Alckmin, quem fica ainda mais confuso é o eleitor. É evidente que não dá para votar em um ou em outro apenas por critérios pessoais, porque um é doutor na ciência o outro é doutor na vida ou coisa que o valha. Não dá para votar só com isso. Isso seria o exercício do voto irracional, sem lógica e sem futuro, o chamado voto emocional.
Devemos votar com a consciência de que estamos votando no melhor para todos os brasileiros e não apenas para alguns segmentos da população. No próximo mandato, o presidente de todos nós, deverá resolver os problemas nacionais que envolvem fazendeiros e sem-terras, operários e industriais, excluídos e incluídos, doutores e analfabetos, saudáveis e doentes. Não se pode conceber que a justificativa para votar em um ou em outro seja porque esse ou aquele segmento está sendo prejudicado ou beneficiado mais do que os demais no atual governo. Isso sempre aconteceu nos governos e deverá acontecer nos futuros.
Somente no Anarquismo, quando não haveria necessidade de autoridade, porque todos fariam o que deveriam fazer sem esperar pelos demais, sem se aproveitar da situação ou sem buscar qualquer privilégio, haveria a possibilidade de igualdade absoluta. Mas isso é coisa para discutirmos no céu e não aqui na terra, onde sempre seremos desiguais. Fazer isso agora seria colocar jabuticabas nas aboboreiras e abóboras nas jabuticabeiras com graves conseqüências para todos nós. E isso não é o que queremos.
Devemos, portanto, mais do que nunca aguçar e usar a nossa inteligência para que não sejamos iludidos com jogos de palavras e conversa mole para boi dormir. Que o nosso voto seja lógico, coerente e racional, tanto para continuar, quanto para alternar. E que haja o devido respeito à nossa inteligência e à soberania da vontade popular.
Ás urnas!
[i] Izaias Resplandes de Sousa, escritor mato-grossense, membro-fundador da UPE (União Poxorense de Escritores) é pedagogo e matemático pela UFMT, Gerente de Cidades pela FAAP/SP e membro do IMGC (Instituto Mato-grossense de Gerentes de Cidade), Especialista em Estatística pela UFLA/MG e Acadêmico de Direito pela UNICEN, de Primavera do Leste, MT.
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